quarta-feira, 25 de julho de 2012

A medicina e a teoria dos grafos  



A teoria dos grafos é uma das áreas mais importantes da matemática discreta, aplicando-se na informática, investigação operacional, economia, sociologia, genética, entre outras.
A teoria do grafos tem como raízes alguns jogos matemáticos recreativos mas é Euler que é atribuída a sua criação quando em 1736 resolveu o problema das pontes de Konigsberg. Konisberg era um pequena cidade universitária prussiana, onde havia sete pontes que cruzavam o rio Pregel; quatro pontes ligavam as margens opostas a uma pequena ilha, outras duas ligavam as margens opostas a uma outra ilha e a outra ponte ligava as duas ilhas.


Foi muito discutido pela população, durante anos, se seria possível partindo de um ponto da cidade, atravessar todas as pontes da cidade, sem repetir nenhuma, e regressar ao ponto de partida. Euler através, possivelmente, do primeiro grafo da história, demonstrou que não era possível realizar tal façanha. O raciocínio de Euler foi muito simples: substituiu as zonas da cidade por pontos e as pontes por traços e percebeu que o problema só era possível se não existissem mais de dois pontos de onde saíssem um número ímpar de traços. Porquê? Porque cada ponto, que não seja o início nem o fim do percurso, tem de ter um caminho para entrar e outro para sair…
 



Uma das ideias base da teoria de redes "small world" é que existem, num universo de 6 biliões de pessoas no planeta, qualquer ser humano está apenas a seis pessoas de "distância" de qualquer outra, porque eu conheço alguém que conhece alguém que... e até chegar ao Papa, por exemplo, são, no máximo, seis passos. Isto em termos da teoria de grafos traduz-se da seguinte forma: suponhamos que temos um conjunto de pessoas que se podem conhecer ou não, representamos cada pessoa por um ponto - vértice do grafo e unimos vértices distintos por meio de uma linha (aresta do grafo) caso as pessoas, representadas por esses vértices, se conheçam. A ordem do vértice A corresponde ao número de arestas (linhas) que emanam desse vértice, ou seja, corresponde ao número de pessoas que a pessoa representada pelo vértice A conhece. Este grafo não é nada simples, muitas das arestas intersetam-se uma vez que, eu conheço sempre algum amigo do meu amigo, as relações não são independentes e variam com o tempo. A teoria de redes "small world" é muito utilizada para estudar as redes sociais, como o Facebook.

O cérebro humano tem uma arquitetura "small world" e provou-se ser bastante útil estudar a suas funções utilizando a teoria dos grafos nomeadamente para estudar que estruturas comunicam com quais e em que número são essas ligações (ordem dos vértice e arestas de um grafo), entre outas. Recorrendo à teoria dos grafos foi possível mostrar que existem regiões cruciais para manter a comunicação entre zonas anatomicamente distantes como por exemplo: o lóbulo temporal é crucial para a formação da memória, o lobo parietal contribui para manter a comunicação entre o lóbulo temporal e áreas do lóbulo frontal.

A progressão da doença de Alzheimer é acompanhada por uma acumulação, no cérebro, de placas amilóides (depósitos de proteínas que bloqueiam e matam neurónios) e uma quebra na comunicação entre células nervosas. Estudo recentes sugerem que a Teoria dos Grafos pode proporcionar uma visão fascinante sobre a progressiva perda de memória provocada pela doença de Alzheimer. Um estudo, publicado em Maio, demonstra que, num estado avançado da doença de Alzheimer, o cérebro estabelece uma rede aleatórias de comunicações entre as suas estruturas onde as ligações (arestas) são mais longas e em maior número (ordem do vértice) do que em pessoas idosas saudáveis.

No Brasil, foi realizado um estudo pelo Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, na área da psiquiatria, envolvendo dois tipos de doentes: esquizofrénicos e maníacos (por às vezes ser difícil diferenciar as duas psicoses) utilizando a teoria dos grafos. Foram entrevistadas com 24 pessoas 
(oito com mania, oito com esquizofrenia e oito sem qualquer distúrbio mental diagnosticado), a quem era pedido para relatar um sonho. Ao transcrever cada entrevista, as as palavras foram representadas por pontos (vértices do grafo) e a sequência entre elas nas frases por linhas (arestas do grafo) unindo dois pontos. As pessoas com mania obtiveram uma pontuação (ordem de cada vértice) superior às que sofriam de esquizofrenia em quase todos os itens avaliados. Verifica-se que os pacientes com mania têm um discurso muito mais longo e com tendência a centrar-se e/ou regressar ao mesmo tópico, em comparação com os pacientes esquizofrénicos. Em termos de grafos traduz-se num emaranhado de vértices e arestas para as pessoas maníacas, e poucas arestas e vértices para os esquizofrénicos .


Artigo no Guardian
Artigo Jorge Buescu sobre pequenos mundos

Artigo científico publicado no Brasil

Sem comentários:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...