"Há muito que escorrego de mansinho pelos conjuntos de mães. Tropeço neles pelos corredores da escola, no portão da entrada, na pastelaria em frente, nas filas dos supermercados, temo que qualquer dia se tornem virais e me tomem à minha passagem, de emboscada. Falam entre elas das roupinhas que não servem, das tosses que nascem indesejadas a meio da noite, de professoras de matemática que não explicam convenientemente a matéria, de directores de escola que deveriam era estar a aprender relações humanas, de professores de educação física que sujeitam meninos a sacrifícios sobre-humanos, aulas debaixo de chuva, nunca foram pais, vê-se bem, se tivessem sido tudo isto lhes faria doer. Encontram-se normalmente de braços cruzados mas de pose preparada à movimentação efusiva, à demonstração por gestos de todas estas desgraças que atacam as criancinhas da casa, indefesas, uns seres pequeninos para sempre que necessitam de guarda próxima, detalhada e partilhada, discutida em praça pública ao mais ínfimo pormenor do detalhe. Como eu, há umas poucas, certamente apelidadas de demitidas. Percebo-as à distância, olham só para o filho quando o acompanham e dizem bom dia às que ficam sem abrandarem o passo, abrandar o passo pode sempre ser a morte do artista e representar a necessidade de permanência forçada na roda das decisões que urgem ser tomadas na hora, no dia, debaixo da chuva ou do sol, para posterior reconhecimento por quem de direito, a directora de turma, figura também ela ligeiramente hedionda. Num ápice entramos no carro e escapamos dali, e deixamos para trás aquele cenário inacabado de cabeças pintadas de cores distintas, as verdadeiras guardiãs dos filhos, delas, dos outros, dos das terras vizinhas e dos do mundo no geral.
Não fosse a meia dúzia que encontro e ficaria deprimida, não há como a pertença para nos segurar a permanência. Assim, e no seio da demissão, sobrevivo todos os dias, ao vê-las passar por mim.
( Curiosamente, e aquando da necessidade de intervenção efectiva e verdadeira, raramente oiço alguma, calam-se, apagam-se, encolhem-se num canto estranho e desaparecem, todas em conjunto, à espera. )"
Texto da autora do blogue Uma Mulher não chora
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