"Há dias falava de palavras, do estardalhaço ininterrupto que fazem dentro de nós, dos estragos capazes de provocar. Há-de ser assim com todos, fazendo menos mossa a uns, que as gerem melhor, mais a outros, que sufocam se lhes não dão primazia, andamento e caminho visível. Tempos houve em que me acalorava a conversa, a comunicação, a fala, o desabafo, as ideias. Hoje, nada disso me interessa como outrora. Chego a ter saudades do silêncio. Palavras leva-as o vento, estrebucha o ditado em mim. Estafam-me conversas sérias, cansam-me as opiniões sobre tudo e mais alguma coisa. Os porquês disto e daquilo, que se exigem a ferro e fogo, servindo umas poucas de inverdades e de loucuras. Encantam-me os que sem abrir boca dizem tudo. E vou à lua com os que teimam fazer com o gesto o seu discurso, a sua declaração de amor. Hoje, percebo uma série de homens calados que havia antigamente. E as mulheres que agora me dizem “fazes-me rir”. Conversas, de facto, só para rir. Para chorar, para ensinar, para guardar, escrevam. Mergulhem no silêncio, oiçam-se e escrevam como souberem. Nas mãos, nas paredes, nos panos da loiça. De resto, poupem-se. Senão um dia ninguém vos ouve."
Texto de Gui Abreu de Lima no Delito de Opinião
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