sábado, 29 de dezembro de 2012

A impossível profissão!

Não diria impossível, ainda, mas que caminhamos para lá em largos passos! 
Artigo copiado do site da SPM


"Foi Freud (1937) quem mencionou as três profissões impossíveis: a de psicanalista, a de governante e a de professor. Deixemos a discussão em torno das duas primeiras e não aprofundemos a questão da profissionalidadeda governação. Centremo-nos na docência e na sua progressiva impossibilidade. 

Impossível profissão, esta de fazer aprender todos os alunos que nos são confiados. Porque alguns não querem aprender o que prescrevem que eu ensine; porque o prolongamento arbitrário da compulsão escolar de 12 anos cria ambientes explosivos; porque é impossível ensinar segundo as necessidades individuais de cada aluno, diferenciar sistematicamente as condições de aprendizagem, realizar uma avaliação personalizada quando se tem semanalmente de interagir com cerca de 200 alunos; porque as condições de trabalho têm vindo a ser progressivamente mais complexas e exigentes; porque o valor social da educação anda pelas ruas da amargura;porque a mobilidade social ascendente já quase não existe, estando mesmo em regressão; porque os climas e as culturas escolares se mantêm numa contínua instabilização que tornam precários os vínculos profissionais e organizacionais; porque o Diário da República continua a sua fúria de prescrição e de inutilidade, decretando a destempo e definindo regras quando o jogo vai já a meio. 

Mas se a profissão sempre foi impossível, desde 2008 – com a aplicação do novo ECD - cresceu exponencialmente a natureza da sua impossibilidade. Com os professores a serem progressivamente desautorizados, menorizados e colonizados por um sistema hipercentralizado; a verem o seu tempo de aprisionamento escolar aumentado, muitas vezes em tarefas inúteis; a terem de exercer o ofício de guardadores de rebanhos numa prática dedesprofissionalização destrutiva; a sentirem a exaustão perante tantas exigências muitas delas sem sentido e sem qualquer alcance pedagógico (de que os planos de recuperação agora formalmente extintos foram um exemplo); a verem o crescimento da confrontação pública e a exposição derivadas dos rankings que parecem cumprir sobretudo a missão do nomear e do envergonhar.

Mas o último golpe parece estar agora para vir, com o efeito conjugado de duas medidas de destruição massiva: o aumento do tempo do horário de trabalho para 40 horas semanais e com o crescimento do tempo letivo para um horário semanal entre 25 e 27 horas e o prolongamento da idade da reforma para os 65 anos. 

Passar a ter mais alunos por turma; passar a ter mais turmas; passar a ter de ensinar (e avaliar) semanalmente entre 150 e 250 alunos; ter de lecionar várias horas seguidas a turmas diferentes, tendo todos os dia de interagir com muitas dezenas de alunos com perfis, expetativas e disposições diferentes vai ser uma prática de uma extrema violência e de um desgaste incalculável. 

Nenhuma profissão tem esta exigência. Merece, por isso, extrema atenção e cuidado. E o mais largo e consistente reconhecimento e apoio. Sob pena desacrificarmos definitivamente o futuro."      

José Matias Alves: Professor da Universidade Católica Portuguesa em Ciências de Educação


 



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